Caríssimos Dom José Palmeira Lessa, Arcebispo Emérito de Aracaju, Padre Valtewan, Vigário Geral, prezados, Padre Peixoto, prezado padre Adeilson Carlos, queridos sacerdotes da Arquidiocese que vieram para esta celebração eucarística de ação de graças à padroeira de Aracaju e de toda a Arquidiocese.
Diáconos, seminaristas, líderes das pastorais, movimentos e serviços da Arquidiocese de Aracaju e das outras dioceses de nossa província. Queridos visitantes. Irmãos e irmãs presentes e os que nos acompanham através dos meios de comunicação social.
É com muita satisfação que presido pela primeira vez a missa solene da festa de Nossa Senhora da Conceição, padroeira de Aracaju e toda a Arquidiocese. Desde os primórdios da fé em Sergipe a devoção à Nossa Senhora está muito presente. Mas com a criação da nova capital do Estado de Sergipe e para atender as novas demandas do estado, Dom Manoel Joaquim da Silveira, Arcebispo da Bahia, em 1862 criou a paróquia dedicada à Nossa Senhora da Conceição, padroeira da cidade Aracaju. Em 1910, com a criação da sede episcopal de Aracaju, Nossa Senhora da Conceição foi proclamada a padroeira de todo o território diocesano. Agradecemos a Deus pelo patrocínio da mãe de Jesus e nossa.
Maria, mãe orante
É o tema da festa deste ano, obedecendo ao que o Papa Francisco indicou como preparação imediata para Ano Jubilar de 2025, peregrino de esperança: “seja 2024 dedicado à oração. Para que possamos recuperar o desejo de estar na presença do Senhor, escutá-Lo e adorá-Lo […] um ano intenso de oração, em que os corações se abram para receber a abundância da graça” (11 de fevereiro de 2022 CARTA DO PAPA FRANCISCO, ARCEBISPO RINO FISICHELLA PELO JUBILEU 2025).
Irmãos e irmãs, no dia 29 de dezembro deste ano, estaremos novamente aqui na Catedral Metropolitana, para o conjunto das cerimônias de abertura do Jubileu ordinário, que celebra os nossos primeiros 25 anos, como peregrinos de esperança entre os desafios do século XXI.
É justo que coroando o ano da oração, nos detenhamos em nossa querida mãe, Nossa Senhora.
A Exortação Apostólica de São Paulo VI, Marialis cultus, nos 16-18, afirma: “Maria é exemplo da atitude espiritual com que a Igreja celebra e vive os divinos mistérios. É a Virgem que sabe ouvir, acolher a palavra de Deus com fé […] Santo Agostinho diz antes de conceber Cristo no seu seio, o concebe na sua mente”.
“Maria é dada à oração. O “Magnificat” (cf. Lc 1,46-55), a oração por excelência de Maria, o cântico dos tempos messiânicos no qual confluem a exultação do antigo e do novo Israel […] Este cântico da Virgem Santíssima, na verdade, prolongando-se, tornou-se oração da Igreja inteira, em todos os tempos. Em oração aparece Maria, também, em Caná, onde, ao manifestar ao Filho, com imploração delicada, uma necessidade temporal, obteve também um efeito de graça: o primeiro dos seus “sinais” que confirma os discípulos na fé (cf. Jo 2,1 12). Por fim, ainda a última passagem biográfica relativa a Maria no-la descreve orante: os Apóstolos “perseveravam unânimes na oração, com algumas mulheres, entre as quais Maria, a mãe de Jesus, e com os irmãos dele” (At 1,14). Presença orante de Maria na Igreja nascente, pois, e na Igreja de todos os tempos; porque ela, assumida ao céu, não depôs a sua missão de intercessão e de salvação (LG 62)”.
Essa função exemplar Maria só podia exercer sendo maravilhosamente preservada pelo seu Filho do pecado original. São Leão Magno: «A graça inefável de Cristo deu-nos bens superiores aos que a inveja do demónio nos tinha tirado» (310). E São Tomás de Aquino: «Nada se opõe a que a natureza humana tenha sido destinada a um fim mais alto depois do pecado. Efectivamente, Deus permite que os males aconteçam para deles tirar um bem maior. Daí a palavra de São Paulo: “onde abundou o pecado, superabundou a graça” (Rm 5, 20) (CIC 411 e 412).
Essa posição privilegiada de Maria, encontramos nas leituras da missa de hoje.
Leitura do Livro do Gênesis 3,9-15.20.
É sempre importante recordar quando lemos as narrações da criação do livro do gênesis, que mais do que fatos, os trechos da criação apresentam para nós significados (cf. Megan McKenna, El Adviento y la Natividad día a día, Sal Terrae, p. 506).
Apesar de estarmos nas primeiras páginas da escritura, a reflexão está em consonância com os sábios do AT. Quando o povo se afasta da lei do Senhor, a consequência é a desgraça. O primeiro casal experimenta essa realidade. No entanto, Deus não abandona a criatura e se mostra sempre aberto ao perdão. Ele nunca se deixará influenciar negativamente pelas infidelidades de sua criatura (cf. Commento delle letture domenicali, a cura de Robert Gantoy, p. 1831).
Onde estás? Não parte de um juízo, de uma condenação, mas de uma busca, de uma procura! Dirigindo-se assim ao homem Deus quer fazer com que ele tome consciência da gravidade de sua culpa e lhe dar também oportunidade de pedir perdão.
Adão ao invés de se desculpar, procura atribuir a Deus a responsabilidade do ocorrido: “A mulher que tu me deste por companheira”. Adão que antes tinha dito que Eva era carne de sua carne, agora diz que ela lhe deu do fruto proibido. Eva, por sua vez, se desculpa, dizendo que comeu o fruto porque a serpente lhe ofereceu. Adão acusa Deus, depois acusa a Eva, e Eva acusa a serpente. É uma situação de ausência de solidariedade e de responsabilidade. (cf. Ibidem, Robert, p. 1832).
Interessante que Deus só se dirige com severidade à serpente, condenando-a veementemente pela responsabilidade da entrada do pecado no mundo (Ibidem, Robert, p. 1832). Será maldita entre todos os animais. Rastejarás sobre o ventre e comerás pó todos os dias da tua vida! (Gn 2,14).
E Adão chamou à sua mulher “Eva”, porque ela é a mãe de todos os viventes.
“Aconteça o que acontecer, a lei é a continuidade da vida. Deus, criador de todas as coisas, sustenta, patrocina e protege a vida. Eva continuará geradora de vida” (Megan McKenna, El Adviento y la Natividad, dia a dia, Sal Terrae, p. 507).
Se Eva cedeu, existe sempre uma mulher que poderá reconstruir: a mãe do Messias prometido.
“E porque fez isso? Para que Eva reabilitasse por meio de sua Filha, e acabar a queixa do homem contra a mulher. Adão, não diga: ‘A mulher que me deste por companheira me deu o fruto proibido’. Diga outra coisa: ‘A mulher que me deste me alimentou com o fruto bendito’ (São Bernardo. Em el nascimiento de Maria, p. 425).
Leitura da Carta de São Paulo aos Efésios 1,3-6.11-12
Parecia que Deus tivesse um projeto muito limitado: escolheu o povo de Israel e somente a ele dedicasse a sua atenção. Mas o apostolo Paulo aprofunda. Escolhendo o povo de Israel, Deus o fez em vista da salvação de todos. O seu plano se estende maravilhosamente a todos os homens e mulheres. Não existe limite para a generosidade de Deus. Ele quer chamar todos à glória de Cristo. Não são somente os judeus que se salvam, mas também os pagãos. Judeus e gregos, escravos e livres, ricos e pobres, homens e mulheres. Os braços de Deus no seu Filho Jesus se abrem para envolver a todos os homens e mulheres deste mundo. Na cruz, vemos os braços de Jesus sempre abertos (Papa Francisco).
As realidades celestes estavam separadas das realidades terrestres; não tinham uma comunhão, uma unidade […] Deus inventou este plano, por meio de sua graça. Quando todos deveriam perecer, Ele intervém para que sejam salvos. Todas as graças, todos os abundantes dons que foram dados por Deus em todos os tempos e por meio de vários mensageiros estão recapitulados em Cristo, estão congregados em Cristo. Recapitular quer dizer reunir, resumir em Cristo Jesus. Somos favorecidos por muitos dons e por grande amor (São João Crisóstomo, Comentário às Cartas de São Paulo, vol. 1, Paulus, p. 673).
A alegria que perpassa todo o hino que lemos na segunda leitura nasce da certeza que a bondade de Deus para com os homens e mulheres deste mundo é incondicionada, é pura graça. Nós temos a liberdade de acolher ou não. Se quisermos seremos todos beneficiados.
Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo Lucas 1,26-38
O texto começa com uma indicação temporal importante. “Sexto mês” – Nós podemos nos reportar ao “sexto” dia da criação, quando foi criado o homem. A narração quer dizer que agora começa a ser recriado o homem e poderá ser como diz São Paulo uma nova criatura (Alberto Maggi, vídeo).
O anjo Gabriel tinha sido enviado a Zacarias, sacerdote irrepreensível, que não respondeu como esperado e o anjo resolveu puni-lo com a perda da voz. Agora Gabriel não deve ir à religiosa Judéia, mas à terra pagã, Galiléia; não na cidade santa, mas na mal falada Nazaré, não no Templo, mas numa choupana de um pequeno povoado; é enviado a um sacerdote de pura raça, mas a uma jovem comprometida em casamento (Alberto Maggi, Storia di Maria di Nazaret, p. 58).
A primeira coisa que diz a Maria é “alegra-te cheia de graças”: ‘tu tens todos os motivos para alegrar-te” (cf. Stock, K., La Liturgia de la Palabra, San Pablo, 2002, p. 25). ‘Tu és cheia de graça’, quer dizer, Deus te deu de maneira definitiva e irrevogável o seu favor, sua benevolência. Derrama sobre ti o seu amor cheio de benevolência” […] O título de cheia de graça é tão característico de Maria que o anjo não usa o seu nome próprio. Cheia de graça é o seu nome novo (cf. Ibidem, Stock, K, p. 26).
Depois diz “o senhor é contigo”. Significa que no cumprimento da missão não contarão somente com as suas próprias forças. Deus não se limita a chamar, abandonando depois seus servos à própria sorte, mas os acompanhará, capacitando para levar a pleno cumprimento a missão. Assegura a todos os vocacionados a sua constante e poderosa assistência (Ibidem, Stock, p. 26).
Conceberás e darás luz um filho e porás o nome de Jesus. Maria deve também lhe dar o nome e como ninguém se preocupar e cuidar com solicitude do Filho de Deus. Ela será realmente uma mãe e deve cumprir a missão. É pedida a Maria uma dedicação completa e exclusiva e Maria ficará à disposição de Jesus durante toda a sua vida (Ibidem, Stock, p. 27).
“E como Cristo na conceição de sua Mãe a livrou da morte, enquanto filha de Adão, Maria desterrando-se livrou do mesmo Cristo da morte, em que como inocente de Belém, havia de padecer das mãos de Herodes; esta foi a igual correspondência, e o benefício e preço também igual, com que a Senhora, por meio do seu desterro, pagou ao Filho tudo o que lhe devia na conceição” (Padre Antônio Vieira, Sermão de Nossa Senhora da Conceição na Igreja do Desterro, Bahia, 1639, Sermões, Volume X, p. 241).
“Eis aqui a serva do Senhor. Faça-se em mim, segundo a tua palavra”. A mulher não podia tomar nenhuma decisão sem consultar primeiro o marido e obter dele a aprovação. Maria não informa a José, não pede a sua autorização. Maria aceita. contrariamente a Zacarias, vibra com a palavra do Senhor e se torna a colaboradora de Deus que precisa comunicar a sua vida à humanidade (Alberto Maggi, Storia di Maria di Nazaret, Garzanti, 2021, p. 58).
A vocação procede da benevolência e do favor do amor de Deus e será acompanhada de sua ajuda eficaz. A vocação incide sobre a pessoa toda e a absorve em todo o seu tempo. Maria colocará toda a sua vida a serviço de Jesus e desse serviço viverá em constante alegria (Stock, p.29).
O Deus que se dirige a Maria tem ainda muita necessidade de encontrar colaboradores para poder se fazer presente e vivo no nosso mundo, entre os homens de ontem, hoje e sempre.
O Deus de Maria continua buscar quem lhe conceda atenção e algo a mais, a própria vida. Todos nós somos chamados neste advento a oferecer a Deus essa possibilidade.
Concluímos com o texto que está no Ofício das Leituras da Solenidade de hoje.
Das Meditações de Santo Anselmo, bispo.
Ó Virgem, pela tua benção é abençoada a criação inteira!
“O céu e as estrelas, a terra e os rios, o dia e a noite, e tudo quanto obedece ou serve aos homens, congratulam-se, ó Senhora, porque a beleza perdida foi por ti de certo modo ressuscitada e dotada de uma graça nova e inefável. Todas as coisas pareciam mortas, ao perderem sua dignidade original que é estar em poder e a serviço dos que louvam a Deus. Para isto é que foram criadas. Estavam oprimidas e desfiguradas pelo mau uso que delas faziam os idólatras, para os quais não haviam sido criadas. Agora, porém, como que ressuscitadas, alegram-se, pois, são governadas pelo poder e embelezadas pelo uso dos que louvam a Deus”.
[…]
“Ó mulher cheia e mais que cheia de graça, o transbordamento de tua plenitude faz renascer toda criatura! Ò Virgem bendita e mais que bendita, pela tua benção é abençoada toda a natureza, não só as coisas criadas pelo Criador, mas também o Criador pela criatura!
Deus deu a Maria o seu próprio Filho único, gerado de seu coração, igual a si, a quem amava como a si mesmo. No seio de Maria, formou seu filho, não outro qualquer, mas o mesmo, para que, por natureza, fosse realmente um só e o mesmo Filho de Deus e de Maria! Toda a criação é obra de Deus, e Deus nasceu de Maria. Deus criou todas as coisas, e Maria deu à luz Deus! Deus que tudo fez, formou-se a si próprio no seio de Maria. E deste modo refez tudo o que tinha feito. Ele que pode fazer tudo do nada, não quis refazer sem Maria o que fora profanado”.
[…]
“Verdadeiramente o Senhor é contigo, pois quis que toda a natureza reconheça que deve a ti, juntamente com ele, tão grande benefício”.
Fotos: Pascom/ Marcos Paulo @marcospaulo_se