Padre Everson Fontes Fonseca,
Pároco da Paróquia Sagrado Coração de Jesus (Grageru)
Um novo momento se descortina na missão de Jesus a partir do Evangelho que acabamos de escutar. O Senhor revela que, subindo a Jerusalém, para lá sofrer a Paixão e a Morte de Cruz, ressuscitando após, também nos salvará e como tal feito se dará.
A dimensão universal da salvação que o Cristo veio oferecer deve comportar todos. Daí é que vemos o Senhor desenvolver o Seu ministério também em territórios pagãos, querendo resgatar as ovelhas perdidas, que, antes de Sua Cruz, não pertenciam ao Seu rebanho. É em Cesareia de Filipe que, pela primeira vez, Jesus revelará aos Seus discípulos o que estava escondido no coração de Deus desde toda a eternidade: como “o Filho do Homem devia sofrer muito, ser rejeitado pelos anciãos, pelos sumos sacerdotes e doutores da Lei; devia ser morto, e ressuscitar depois de três dias” (Mc 8,31). E tudo isto, repito, para nos salvar num amor extremo de dar a vida para resgatar tantas e tantas outras.
A linguagem de Deus, o Seu plano de salvação, é incompreensível a uma mera razão humana por causa da profundidade e da suma altura de como acontecerá o mistério da Salvação. Vemos que a reação de Pedro exemplifica o que queremos afirmar. Por não querer mergulhar na misteriosa lógica de Deus e de Seu amor, aquele que, antes, fora instituído ‘Príncipe dos Apóstolos’ (cf. Mt 16,16), agora recebe o nome de Satanás por um duplo motivo: o primeiro deles, por pensar como um homem – não-espiritual, portanto – e querer que Deus se enquadre à sua falida lógica; segundo, porque tem horripilância à Cruz, querendo fugir dela, ao tempo em que deseja afastar outros do caminho do Cristo Crucificado, tal como faz o diabo.
Após a reprimenda dada a Pedro, o Senhor chama os que, de maneira disponível, desejam segui-Lo na radicalidade de suas vidas, sujeitando-se, inclusive, às cruzes pessoais a que são acometidos como participação da única Cruz do Salvador (que também é nossa), e lhes dá um ensinamento diverso do que ora está em voga no mundo, que odeia e incita a que fujamos da Cruz: “Se alguém quer me seguir, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e me siga. Pois quem quiser a sua vida, vai perdê-la; mas quem perder a sua vida por causa de mim e do Evangelho, vai salvá-la” (Mc 8,34-35). Logo, a grande lição dada pelo Senhor é que sejamos ‘amigos da Cruz’, que sejamos também crucificados no combate ao que não vem Dele, e, por isso, contradiz o Seu projeto de amor. Prazeres, apegos aos bens, às posições, às aparências, enfim, que sejamos pregados pelo mundo a Cristo Crucificado, por Ele e com Ele.
Para, conscientemente, ingressarmos nesta lógica desafiadora é preciso que sejamos igualmente conscientes de quem é o Senhor. E, de maneira convicta, num processo de descoberta e redescoberta cotidianas, mergulharmos n’Ele para sermos sabedores de Sua identidade, e cada vez mais nos deixarmos cativar, apaixonados, por Cristo.
Sobem à Cruz conosco e com o Senhor tantos outros. Pessoas que conhecemos ou não. Estes, crucificados por tantas carências de ordem espiritual, ou mesmo material. Não nos esqueçamos deles! Caso contrário, estaremos, gravemente, desperdiçando as ocasiões de aplicar a nossa fé à prática das obras de vida (cf. Tg 2,18) para benefício dos outros, em especial dos pobres, para que dores sejam minoradas e a glória do Senhor resplandeça na dignidade de suas vidas.