Hoje, após o Pentecostes, celebramos a Solenidade da Santíssima Trindade, na qual a Igreja reflete acerca da essência trinitária de Deus: uma Única e Suprema divindade em Três Pessoas. Esta é a primeira de três solenidades conseguintes, já que, na próxima quinta-feira, celebraremos a Solenidade de Corpus Christi; e, na sexta-feira da semana seguinte, a Solenidade do Sagrado Coração de Jesus. Cada uma destas três datas litúrgicas possui uma evidência peculiar, já que elas pretendem abarcar todo mistério da vida cristã da salvação, sintetizando, de certa maneira, a revelação de Jesus Cristo, da sua encarnação à morte, ressurreição, ascensão, bem como à doação do Espírito Santo. A solenidade de hoje convida-nos à contemplação de um “céu aberto”, depois de uma revelação paulatina, mas profunda, de cada uma das Pessoas Trinitárias, inserindo-nos, com o olhar da fé, no mistério de um Deus, Uno na substância e Trino nas Pessoas.
A Oração de Coleta inicia apresentando-nos o Pai como o remetente da missão do Filho e do Espírito Santo: “Deus, nosso Pai, enviando ao mundo a Palavra da verdade e o Espírito santificador, revelastes o vosso admirável mistério. Concedei-nos, na profissão da verdadeira fé, reconhecer a glória da Trindade e adorar a Unidade na sua onipotência”. Ou seja: o Pai envia em missão o Filho e o Espírito Santo com a finalidade de revelar ao mundo o seu “admirável mistério”. Mas, por que o Pai tem esta atitude? O Evangelho segundo São João é uma chave de resposta: “Deus tanto amou o mundo, que deu seu Filho Unigênito, para que não morra todo o que nele crer, mas tenha a vida eterna” (Jo 3,16). É porque nos ama; é para que nos salvemos, que Deus se revela. Porém, ao revelar a Sua glória Trinitária e Unidade onipotente, Deus nos vocaciona para o seio desta “Comunidade de Amor”, onde o Pai ama eternamente o Filho, o Amante Divino ao Eterno Amado (cf. Mt 3,17; 17,4; Mc 1,11; 9,7; Lc 9,35; Jo 5 20; Cl 1,13; 2Pd 1,17), ao tempo em que o Eterno Amado corresponde ao sentimento do Pai amando-O, fazendo inteiramente a Sua vontade. Deste inesgotável intercâmbio, eis o Espírito Santo, o Amor, promotor desta relação misteriosa, porque é divina. É ainda vontade do Pai que a criatura humana seja inserida pelo Filho nesta “Comunidade”, embora pelo que, por nós mesmos, não tenhamos nada a acrescentar nessa sublime relação intratrinitária. Somos filhos pelo Filho, como asseverou São Paulo na Segunda Leitura (cf. Rm 8,14-17). A salvação nada mais é do que este habitar eternamente no seio de Deus, Uno e Trino, porque aí se encontra a plenitude da vida.
É na economia das Pessoas Trinitárias, ou seja, nas Suas manifestações ao longo da História da Salvação, que Deus Se revela; e, na plenitude dos tempos, encarna-Se. Pela encarnação do Verbo Jesus Cristo no seio da Virgem Santíssima não somos mais prejudicados pela visão da glória da divindade, como observou Moisés na Primeira Leitura: “Existe, porventura, algum povo que tenha ouvido a voz de Deus falando-lhe do meio do fogo, como tu ouviste, e tenha permanecido vivo?” (Dt 4,33). Muito pelo contrário: Ele se abaixa à nossa condição, faz-se um de nós: o que, na Teologia denominamos Kénosis, abaixamento. Somente assim, contemplamos o Seu rosto. Jesus é o rosto humano de Deus, como bem afirmou São João Paulo II (cf. Ângelus 11.01.2004). É pelo conjunto kenótico da Encarnação, Vida, Paixão, Morte, Ressurreição e Ascensão de Jesus, Deus Encarnado, que o homem é divinizado. Logo, o ser humano passa a ver Deus, herda a Sua glória, coabitando na Trindade. Mais do que Moisés, que vê o Senhor apenas pelas costas (cf. Ex 33,23), pela vinda do Filho, vemos Deus por inteiro, e mais: tornamo-nos herdeiros de Deus.
Que o Amor trinitário, o Espírito Divino, nos invada e nos conduza à comunhão perfeita e íntima com a Trindade Santíssima, para que, desde já, nesta terra de exílio rumo à Pátria Definitiva, nos irmanemos na comunidade cristã, imitando, com afinco, a doçura e harmonia das Pessoas Trinitárias.
Padre Everson Fontes Fonseca, pároco da Paróquia Sagrado Coração de Jesus (Grageru).